Sabe aquele comprimido que tomamos para dores do dia a dia, aquele que buscamos na farmácia? Você sabia que antes dele se tornar apto para compra e consumo ele passou por uma série de testes? São testes que compõem um conjunto de etapas, e quando somados são definidos como o método científico de investigação, para que um medicamento tenha condições de ir para as prateleiras da farmácia.
A primeira tentativa de método cientifico surgiu no século 18, período de grandes navegações em que muitos marinheiros morriam não apenas nas batalhas, mas por causa do escorbuto. A doença leva a hemorragia nas gengivas, entre outros sintomas, e queda da resistência às infecções.
Foi nessa época que o médico James Lind conduziu testes que compararam tratamentos usados até então contra o escorbuto. O cirurgião escocês recrutou doze de seus pacientes em estágios similares da doença que foram separados em duplas. Eles receberam a mesma dieta, apenas com complementos diferentes. Alguns dos complementos usados foram a cidra, o ácido sulfúrico, o vinagre, a água do mar e duas laranjas e um limão.
A partir dos testes o médico observou que o tratamento à base de laranjas e limões foi o que apresentou melhores benefícios. Anos mais tarde foi possível entender que o escorbuto era causado por carência de vitamina C, por isso a dieta com as frutas foi a melhor opção contra a doença.
Mas o método cientifico é empregado em diversas áreas da ciência e não apenas na medicina moderna.
O termo se refere ao conjunto de regras básicas que devem ser empregadas em toda investigação científica que tem o intuito de obter resultados confiáveis. Geralmente o método engloba algumas etapas como a observação, a formulação de uma hipótese, a experimentação, a interpretação dos resultados e, por fim, a conclusão.
A fase de experimentação é indispensável, principalmente quando falamos do desenvolvimento de novos medicamentos. Essa etapa prevê uma série de testes, primeiro em laboratório, em animais de pequeno porte como os camundongos, depois em outros bichos maiores como os cachorros e chimpanzés, para só no fim os procedimentos seguirem para experimentação em humanos.
Essa fase de testes é assegurada como obrigatória pela legislação brasileira, mas atualmente virou tema de debate devido principalmente ao caso da fosfoetanolamina. Esse composto orgânico, presente no organismo de diversos mamíferos, ajuda a formar as membranas celulares e possui ainda função sinalizadora, informando ao organismo processos e situações que envolvem as células.
Sintetizada pelo químico Gilberto Chierice, no fim da década de 80, ela se popularizou por sua alegada eficiência em combater, reduzir e até por afirmar-se como uma cura para o câncer. Por 17 anos o químico distribuiu gratuitamente e por iniciativa própria a fosfoetanolamina para diversos pacientes. Apenas em 2014 essa distribuição do medicamento foi proibida devido justamente à falta de testes, pesquisas, registros e autorização da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), ou seja, ao não cumprimento do método cientifico previsto como obrigatório pela legislação brasileira.
Porem uma lei sancionada pela presidente Dilma em 13 de abril deste ano prevê a livre produção e comercialização da substância, mesmo antes dos testes pré-clínicos e clínicos.
Do lado dos defensores da fosfoetanolamina, o químico Chierice aponta para os interesses escusos de grandes laboratórios em impedir o surgimento de um medicamento capaz de tornar obsoletos os caríssimos tratamentos contra o câncer.
Mas do outro lado do debate a bióloga e pesquisadora Natália Pasternak Taschner destaca:
Natália Pasternak Taschner – “É muito pouco provável que exista uma cura universal para o câncer, principalmente porque o câncer não é “uma” doença, o câncer são “várias” doenças. O câncer sim a gente pode dizer que é uma doença quase pessoal, personalizada, já que cada câncer é diferente um do outro. Às vezes na mesma pessoa, você começa um tratamento e depois esse tratamento para de dar certo porque a célula tem um ciclo de mutação tão rápido que já não é o mesmo câncer que era quando começou. Isso na mesma pessoa, na mesma doença. Imagina pegar pessoas diferentes! Então é muito pouco provável que algum dia, alguém descubra uma cura universal para o câncer”.
Os testes clínicos estão em andamento, mas enquanto isso a legislação se contradiz autorizando uma droga não validada pela própria agência reguladora, a ANVISA.
Matéria de Fabiana Silva.