Parece que a Realidade Virtual se tornou, de fato, parte da nossa Realidade. Uma conferida no serviço Google Trends, que revela o nível de interesse dos assuntos pesquisados no buscador, mostra que o termo Virtual Reality saltou de nove pontos de interesse em agosto de 2011, para setenta e nove em agosto de 2016.
A curva começou a crescer fortemente em 2014, ano em que a campanha de financiamento coletivo para produção dos Óculos Rift, de Realidade Virtual, atingiu a marca de dois milhões e quinhentos mil dólares no Kickstarter.
Dois anos se passaram sem muito alarde até que fomos surpreendidos com Pokémons espalhados pelas cidades. O game Pokémon GO, que se utiliza de Realidade Virtual para colocar os monstrinhos como se eles estivessem nos cercando no mundo real, é mais uma prova de que os diversos segmentos da indústria começaram a entender o potencial dessa tecnologia que surgiu com simuladores de voo nos EUA em 1950.
Mas onde o Oxigênio quer chegar com tudo isso? Nós queremos falar do Gesture Maps , um aplicativo de Realidade Virtual que pode mudar a cara das sessões de fisioterapia. A ideia de implementar Realidade Virtual nessas atividades é deixá-las mais lúdicas e acelerar o processo de reabilitação de pessoas que ficaram com sequelas por conta de traumas, acidentes ou derrames.
O aplicativo é instalado em um computador com acesso à Internet e funciona em conjunto com um sensor tipo Kinect, popularizado pelo dispositivo para jogos Xbox. O sensor então escaneia o corpo do paciente e o coloca virtualmente em qualquer lugar de uma cidade que já tenha sido mapeado pelo Google Street View. É aí que as sessões tradicionais de fisioterapia ganham um novo gás.
A ideia é encabeçada por Alexandre Brandão, pós-doc no Instituto de Física da Unicamp e pesquisador do BRAINN, um CEPID que trabalha com tecnologias avançadas voltadas ao tratamento de doenças neurológicas. Ele detalha um pouco mais sobre o Gesture Maps.
Alexandre Brandão: A expectativa do Gesture Maps é simular uma caminhada urbana dentro da sua própria residência. Então a partir do momento que você liga esse software ele escaneia o usuário e cria um avatar dele no centro da tela do Google Street View. O usuário escolhe qual rua ele quer explorar e simula uma caminhada apenas fazendo os movimentos de levantar e abaixar os joelhos. Esse movimento corporal controla o software para avançar na rua escolhida para navegar no Street View.”
O Gesture Maps é um aplicativo em fase de protótipo funcional e está sendo testado em alguns centros de reabilitação e institutos de pesquisa. Brandão conta que o objetivo primário do Gesture Maps era atender a pessoas que sofrem de Desorientação Espacial. Esse problema causa dificuldades para que o paciente se localize no espaço e não consiga distinguir as direções a seguir. Então a ideia é que com o aplicativo o paciente consiga simular o trajeto no seu próprio quarto antes de sair de casa ativando a memória com relação a determinado trajeto. Mas outros usos para o Gesture Maps também são possíveis.
Alexandre Brandão:Pode ser aplicado em qualquer tipo de reabilitação que esteja relacionada com a marcha. Então se a pessoa perdeu os movimentos relacionados à marcha, ou se ela tem dificuldade de orientação espacial é possível utilizar esse software para tentar reabilitar os membros inferiores.
Do ponto de vista dos especialistas em reabilitação, o Gesture Maps é uma ferramenta com bom potencial. A fisioterapeuta e doutoranda pela Universidade Federal de São Carlos,Camila Akemi Sakaguchi, que aplicou o software durante seu mestrado na UFSCar com 60 pacientes, conta que esse tipo de aplicação permite que os usuários realizem atividades mais lúdicas, menos maçantes e, consequentemente, mais eficientes.
Camila Akemi Sakaguchi: A fisioterapia e a terapia ocupacional são áreas marcadas por exercícios de natureza repetitiva. E esse ambiente imersivo leva mesmo o nosso paciente para dentro do ambiente de realidade virtual e tira esse caráter repetitivo das nossas sessões. Então eles ficam mais atentos às tarefas que estão realizando, além desse ambiente de descontração, a socialização que a maioria dos jogos têm, a opção multiplayer, entre outros aspectos da realidade virtual.
A fisioterapeuta Sara Regina Meira Almeida, doutora em Ciências Médicas pela Unicamp e pesquisadora associada do BRAINN, toca num importante aspecto ao lembrar que a adoção da realidade virtual na reabilitação vem para somar e não para substituir especialistas e técnicas convencionais.
Sara Regina Meira Almeida:Eu acredito que em nenhum momento vá interferir ou vá substituir o profissional. Essa é uma preocupação que não deve existir. De forma alguma a realidade virtual vem pra substituir o trabalho dos profissionais. Muito pelo contrário. Eu acredito que os jogos na realidade virtual vem para acrescentar à terapia que a gente considera como terapia convencional. Eu acho que esse conceito vai se intensificar nos próximos anos, porque até então vem sendo usado mais em pesquisas e para jogos de crianças e de interação. Mas, em relação à reabilitação esses jogos ainda são pouco estudados.
O Gesture Maps é a ponta do iceberg de um protocolo de Realidade Virtual que ainda tem muito a oferecer. De acordo com Alexandre Brandão, está em desenvolvimento um outro app chamado e-House que abandona o computador e o Kinect e condensa tudo no celular. Com o smartphone acoplado a um suporte chamado VR Box, o que o torna semelhante aos Óculos de Realidade Virtual RIFT, os pacientes entram num universo virtual e podem fazer os movimentos da fisioterapia, sem sair do lugar.
A ideia com o e-House é dar a oportunidade para que o usuário possa experimentar ambientes residenciais tridimensionais. Ou seja, a nova ferramenta não apenas permite o passeio virtual como também possibilita a interação com objetos virtuais.
Alexandre Brandão: O objetivo principal é simular a atividade de vida diária. Simular uma forma de a pessoa estimular um pouco a marcha estacionária, sem que ela tenha que sair do lugar, que fique na mesma posição, apenas contraindo os músculos responsáveis pelo caminhar. O objetivo é explorar um ambiente semelhante a uma casa de verdade no qual a pessoa possa interagir com objetos e assim resgatar a independência para atividades de vida diária.
O controle do ambiente pelo e-House é possível pelo uso de sensores de ultrassom que são fixados nas pernas do usuário. Esses sensores mandam informações por cabos para uma placa arduíno, que fica na cintura da pessoa, e essa placa envia um sinal por Bluetooth para o celular que é responsável por controlar o ambiente da casa. Mas, a depender dos avanços em realidade virtual, os usuários do e-house poderão ir muito além.
Alexandre Brandão: O e-house foi pensado como um ambiente residencial. Simular as atividades de vida diária de um ambiente residencial. O próximo aplicativo que seria voltado para o Google Earth seria para explorar ambientes urbanos. Aí a gente estaria limitado aos ambientes que já foram modelados pelo Google. E ele dá prioridade por modelar ambientes de maior (…) exposição turística.
Se você quiser saber mais sobre o assunto pode consultar o site da Revista Inovação! Uma reportagem sobre o Gesture Maps e um vídeo sobre o e-House foram produzidos para ir mais fundo nesse tema. Acesse o conteúdo em www.inovacao.unicamp.br.
Matéria de Erik Nardini
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