Neste episódio a Fabíola Junqueira (@fabiolamjunqueira) e a Flora Villas (@flora.villas) falam sobre dificuldades da ciência ao longo da história e sua relação com alguns governos ao longo do tempo.
Elas conversaram com o professor Marko Monteiro, do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp e um dos líderes do grupo de pesquisa CIRIS, que investiga Governança, Riscos e Comunicação no Brasil.
Este episódio faz parte de uma série que fala sobre os trabalhos do grupo formado por pesquisadoras e pesquisadores do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, o Labjor, e do Instituto de Geociências, ambos da Unicamp e do Programa de Saúde Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
A divulgação científica destes trabalhos é apoiada pela FAPESP através do Programa José Reis de Incentivo ao Jornalismo Científico, o Mídia Ciência.
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Fabíola Junqueira: Olá, eu sou Fabíola Junqueira e este é o segundo episódio de uma série que fala sobre Governança, Riscos e Comunicação. Assuntos pesquisados pelo grupo CIRIS, criado em 2020 com o objetivo de pesquisar e propor reflexões sobre o desenvolvimento destas áreas no Brasil.
Flora Villas de Carvalho: Olá, eu sou Flora Villas e ao longo dos episódios você vai ouvir pesquisadores e pesquisadoras do grupo CIRIS, que fazem parte dos programas de mestrado e doutorado do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, o Labjor, e do Instituto de Geociências, ambos da Unicamp e do Programa de Saúde Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, além de outros cientistas e especialistas convidados.
Fabíola: Neste episódio vamos falar sobre o cenário político da ciência atualmente e rever um pouco do histórico. Como a ciência foi vista e cuidada no Brasil ao longo do tempo.
[vinheta oxigênio]
Fabíola: Às vésperas do primeiro turno das eleições de 2022 no Brasil, uma das mais importantes revistas científicas do mundo, a Nature, publicou um artigo sobre o que o futuro presidente da república pode significar para a ciência no país. O artigo foi escrito por Jeff Tollefson. Experiente repórter nas áreas de ciência ambiental e políticas públicas que envolvem mudanças climáticas, energia e desenvolvimento global. Questões muito importantes. Questões que devem ser refletidas e discutidas no Brasil principalmente depois de escancaradas as diversas crises pelas quais estamos passando.
Thiago Ribeiro: “Em junho, a Academia Brasileira de Ciências divulgou um relatório para os diversos candidatos que concorrem à presidência do Brasil, pedindo investimentos em ciência, educação e desenvolvimento sustentável. Apenas um respondeu. Representantes da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera as pesquisas à medida que as eleições de 2 de outubro se aproximam, visitaram cientistas na academia do Rio de Janeiro algumas semanas depois.”
Fabíola: A Academia Brasileira de Ciências foi fundada há mais de 100 anos, com o objetivo de estimular o desenvolvimento da pesquisa brasileira e a difusão do conceito de ciência como fator fundamental do desenvolvimento tecnológico do país. À época da fundação, em 1916, somente as áreas Matemática, Ciências Físico-Químicas e Ciências Biológicas faziam parte da instituição. E somente treze anos mais tarde a publicação regular dos Anais da Academia Brasileira de Ciências foi assegurada.
Flora: Muito tempo se passou e a nossa compreensão de ciência foi se transformando, se desenvolvendo, reconhecendo que ciência é muito mais do que as áreas calculáveis do conhecimento. Há diversas formas de se fazer ciência, a partir de diversas áreas, de diversos saberes. Quando falamos de ciência não estamos falando apenas das Ciências Duras, aquelas feitas em laboratórios de física, química, biologia, com o cientista usando jaleco branco e manuseando beckers e pipetas, por exemplo, ou fazendo cálculos complexos em lousas ou em computadores de ponta.
Fabíola: Ao longo do tempo, a Academia Brasileira de Ciências foi incorporando outras áreas do conhecimento. Mas foi somente a partir do ano 2000 que a instituição abriu as portas para as Ciências Humanas. Área que envolve estudos como História, Sociologia, Filosofia, Psicologia, Comunicação, Globalização e Humanização, Meio Ambiente, Literatura, Artes, Economia, entre outras. Áreas que estudam o ser humano como um ser social, que se relaciona entre si, que se relaciona com o mundo, com o meio ambiente, com o outro, sendo O Outro, um ser humano ou não humano. As ciências dos povos originários, por exemplo, consideram rios, animais e montanhas tão ou mais importantes do que eu ou você.
Flora: Foi apenas em 2022 que uma cientista mulher assumiu a presidência da academia. A biomédica da Universidade Federal de São Paulo, Helena Nader, deve ficar à frente da instituição por três anos, até 2025. Isso significa representar as demandas da comunidade científica em um cenário de instabilidades políticas vindo de um histórico de constante redução de investimentos e crescente negacionismo à ciência.
Fabíola: E foi pensando na questão do negacionismo à ciência que conversei com o professor Marko Monteiro, professor e pesquisador do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp e um dos líderes do grupo de pesquisa CIRIS, que se dedica a compreender como estamos em relação à Governança, Risco e Comunicação no Brasil. Há anos ele vem refletindo e contribuindo para o debate deste assunto. Recentemente Marko participou da publicação de um dicionário sobre os negacionismos no Brasil.
Marko Monteiro: E começou com um artigo, um artigo de opinião que eu escrevi na Tapuya que chama Ciência Uma Zona de Guerra. Esse texto por algum motivo foi bem… circulou bastante, muita gente olhou. Eu escrevi meio que naquele calor de pensar essa questão do negacionismo crescente no Brasil e uma guerra contra a ciência no Brasil, né? E também naquele artigo da Tapuya eu estava tentando pensar a ciência como uma zona de guerra no sentido de que é um locus de disputa muito forte, de pessoas atacando cientistas, atacando intelectuais, um sentimento anti intelectual que a gente vem discutindo desde 2016, em outros projetos que eu tava envolvido. Isso vem só crescendo, né? E você vem ver as políticas um certo desmonte, né? A questão do desfinanciamento da ciência, aí chega a pandemia e começa né?
Flora: Nos primeiros anos da pandemia de COVID-19, além da falta de apoio ao desenvolvimento da ciência e combate ao vírus, o governo Bolsonaro negou recomendações importantes em relação à contenção da contaminação e tratamento. Pesquisadores de saúde pública criticam a recusa em implementar o lockdown, a disseminação de desinformação sobre vacinas e o incentivo ao uso de medicamentos ineficazes no tratamento como a hidroxicloroquina.
Fabíola: No artigo “Ciência uma zona de guerra”, escrito antes do início da pandemia, por Marko Monteiro na revista científica de estudos latino americanos sobre ciência, tecnologia e sociedade, a revista Tapuya, o professor já alertava sobre crises que ficaram evidentes com a chegada do novo vírus.
Aqui você ouve um trecho do que ele escreveu:
Thiago: “A América Latina está pegando fogo. A turbulência política atingiu a região em uma onda que não era vista há décadas. Movimentos de extrema direita emergiram com sucesso como uma nova força política, com o Brasil à frente desse novo “movimento” de escala global. As mudanças na política e nas práticas de construção da verdade estão (como sempre) profundamente entrelaçadas, desafiando o lugar da democracia e da ciência na sociedade brasileira contemporânea. Enquanto os brasileiros continuam sofrendo as doses quase diárias de ataques bizarros e violentos a instituições ligadas à democracia, cultura, direitos indígenas, educação e ciência, cientistas e pesquisadores foram forçados a repensar como praticam e entendem a ciência como forma de vida, para o presente e para o futuro.”
Marko: Saiu em 2020 né, mas não tem exatamente a ver só com pandemia, né? Tem a ver com esse contínuo de coisas. Esse artigo gerou interesse no Zé que veio falar “bom, estamos fazendo um dicionário”, a questão negacionismo tava muito forte…
Flora: Aqui o professor se refere ao “Dicionário dos Negacionismos no Brasil”. Um livro que reuniu mais de 100 cientistas para falar de verbetes relacionados aos negacionismos identificados no Brasil atualmente. Um dos organizadores desta publicação foi o professor José Luiz Ratton da Universidade Federal de Pernambuco. Quando você terminar de ouvir este episódio vale a pena conferir o episódio número 151 do Oxigênio. A gente falou sobre este dicionário e entrevistou o professor Ratton.
Fabíola: Voltando ao professor Marko. Ele continua nos contando sobre como surgiu o verbete Guerras da Ciência que ele escreveu no “Dicionário sobre os Negacionismos no Brasil.”
Marko: Foi derivada de uma preocupação de um de alguns anos que eu venho tendo e foi um encontro do que eu tava falando com o que o Zé estava organizando e guerras da ciência surgiu desse jeito, né? Tentando entender a questão de conflito. E como que isso tinha acontecido naquele momento, né? Como que isso seria interessante para pensar negacionismo? Então eu peguei algumas coisas desse artigo da Tapuya para colocar no texto do dicionário, né para começar a discussão. Eu tento puxar a questão da guerra da ciência para agora, para tentar entender questões de agora, então é um pouco nesse sentido.
Flora: Mas parece que esta preocupação em relação à credibilidade e aplicação da ciência não tem incomodado apenas os cientistas brasileiros. A Fabíola perguntou para o professor como surgiu essa inquietação e ele contou sobre um movimento que apoia a análise de discursos relacionados à pesquisa responsável e os caminhos para a sua implementação, incluindo barreiras e oportunidades, presentes na condução e no financiamento de pesquisas em 24 organizações de investigação, em 13 países europeus e não europeus. Trata-se do RRI Practice ou Pesquisa e Inovação Responsável na Prática.
Marko: Surgiu de um projeto que eu participei com o Philip Macnaghten que a gente fala bastante dele, lá no CIRIS, por exemplo, de Inovação Responsável, Pesquisa em Inovação Responsável numa perspectiva comparativa, o RRI Practice. Tem os materiais online, eu posso até te passar. Tem um relatório grande que a gente fez, eu e um pós doc meu principalmente sobre minha supervisão. O relatório brasileiro, a gente fez uma ampla análise de questões de ciência. E a ideia era então entender se essa Perspectiva da Inovação Responsável tinha alguma aderência no Brasil. Como é que ela poderia ser implementada aqui, se ela teria, digamos, pertinência. Lembrando que Inovação Responsável tem um pouco essa característica de tentar alinhar a ciência com tentar alinhar a produção da ciência com valores sociais, com visões de futuro. Entende a ciência como sendo algo que produz futuros, então tem que ser debatida socialmente. E como que isso deve ser feito, né? Isso deve ser feito a montante do processo científico tecnológico, não depois né. Então diferente de uma noção de lidar com impactos da Ciência e Tecnologia, você tenta antecipar, tenta coordenar para produzir impactos desejáveis e não lidar com o impacto depois que a tecnologia já aconteceu. E aí nesse nesse processo a gente foi pesquisando os aspectos que a União Europeia, define como Inovação Responsável. Gênero, governança, comunicação. Na União Europeia, que já implementou isso, né? Então, ética, igualdade de gênero, governança, acesso aberto, engajamento público e educação científica. São os elementos que a União Europeia define como sendo o que compõe. E tem também algumas dimensões mais analíticas de, que para mim interessa muito mais, que é antecipar, ter uma postura antecipatória, ter uma postura inclusiva, para pensar ciência e tecnologia, reflexiva e responsiva.
Fabíola: E eu perguntei ao Marko sobre a situação do Brasil no momento destas discussões, a partir desta perspectiva. Ele relembra o ano de 2016, quando houve o golpe parlamentar e a ascensão do presidente Temer. De acordo com o professor, naquela época já era possível detectar o aumento dos negacionismos.
Marko: Uma ascensão de uma anti esquerda, muito mais do que de uma direita conservadora, também de um sentimento de anti esquerda, de uma negação de tudo que seja supostamente de esquerda até. Porque os intelectuais sempre foram agrupados como se todo mundo fosse de esquerda naturalmente. Então as Universidades começaram a ser alvo de ataques, você tinha ataques à democracia, aquela greve dos caminhoneiros, então a gente falava disso tudo. Tinha desfinanciamento, como eu falei. Acaba como Ministério da Ciência Tecnologia, você tem sinais muito claros de desmobilização de um aparato governamental e ao mesmo tempo a sociedade atacando, partes importantes da sociedade questionando a universidade que é onde se faz ciência no Brasil. Então a gente ficou preocupado com isso e falava sobre isso, né? Então negacionismo já estava aparente naquela época e hoje, digamos, está no poder, está nos ministérios, está fazendo política pública, né?
Fabíola: Com a pandemia muitos cientistas ganharam visibilidade na mídia. Passaram a dar entrevistas e alguns até criaram seus próprios canais de comunicação com o público na tentativa de transmitir conhecimento diretamente aos interessados, sem intermediários, evitando descontextualizações e desinformações. Mas é justamente olhando para trás, estudando a governança da ciência que percebemos que falar com a sociedade não é um ponto forte da comunidade científica no Brasil.
Marko: Ao tentar estudar a governança da ciência no Brasil a gente se deparou com essa problemática. Uma ciência enclausurada, que não dialoga muito. Toda a questão da Inovação Responsável é promover diálogo entre ciência e a sociedade, você abrir a governança para participação pública, e a questão da democracia. Então pela questão da Democracia é que a gente chega nesses processos. Num país que critica a democracia, que não confia em democracia, que não tem uma democracia consolidada, né? Tanto que hoje você liga o jornal, todo dia você vê isso. Então isso já estava em 16, em pauta, né? Não é uma coisa de agora. O que tem agora é um acirramento cada vez maior, outra escala e outra qualidade, né? O debate é diferente, mas é um processo de mais longa duração.
Flora: No início deste episódio nós falamos sobre as áreas que faziam parte da Academia Brasileira de Ciências no início do século 20 e que somente mais tarde as Ciências Humanas passaram a fazer parte da instituição. A gente costuma pensar na guerra da ciência como essa disputa entre os cientistas naturais versus cientistas sociais sem perceber que essa dinâmica interna na academia reflete uma dinâmica social mais ampla, que de certa forma denuncia uma crise democrática.
Marko: O que a gente chama de guerra da ciência, a gente percebe como sendo assim “Ah os cientistas naturais contra os cientistas sociais” ou “as posturas mais positivistas e posturas mais desconstrucionistas”. Então isso tem tem uma dinâmica interna de que… no fim dos anos 70, anos 80, você começa a ter a Filosofia, as Ciências Sociais, Literatura, as Humanidades e as Artes criticando meta categorias, grandes meta narrativas. Então essa seria uma história interna, internalista. O que eu estava tentando chamar atenção é que isso não está descolado de dinâmicas externas. Então não é só que cientistas naturais vão atacar os sociais ou os pós-modernos e vice-versa. E essa dinâmica continua né? A questão da pós-verdade, a questão da crítica à sociologia da ciência, aos estudos sociais da ciência, isso continua acontecendo, né? E dentro da Universidade isso sempre esteve em pauta, essa discussão interna entre “precisamos defender uma ciência pura, uma ciência como locus da verdade e não aceitar essas críticas feitas à ciência. Isso não está descolado do que tá acontecendo fora porque, digamos, nos anos 80 a crise da democracia no mundo não era tão perceptível, não estava na agenda. Hoje ela está. Então quando você tem a crise, o crescimento do problema climático como sendo da agenda global, da agenda política global, ao longo dos anos 80, 90 e e século XXI, isso só cresceu. O IPCC, Rio 92 foi um grande marco. Mas depois… isso só vem a crescer, né? A importância de discutir. Ao mesmo tempo você tá discutindo se é real cientificamente ou não, se é uma questão também social, se é a ciência que tem o poder de definir. Então quando você faz essa correlação, o que eu acho importante, é também entender a as conexões com o que tá acontecendo fora. O que muita gente acha que se você reflete sobre a ciência como uma instituição social, você enfraquece o papel da ciência como produtora de verdades. Então os cientistas, vamos chamar de positivistas, que defendem que a ciência é questionável como produtor de verdades, vão atacar os mais críticos ou os mais pós-modernos como se eles tivessem causando esse questionamento da ciência e da democracia. E por outro lado quem defende uma postura mais crítica reflexiva vai chamar, né? Aí eu me alinho mais essa outra postura de que “bom, se você recusa a ideia de que a ciência também é parte da sociedade, você só alimenta essa desconfiança com relação à Ciência.
Fabíola: Nos últimos anos acompanhamos a ascensão da extrema direita em diversos países do mundo. Nos Estados Unidos, na Hungria, na Turquia e no Brasil. Em todos estes países a questão da ciência está em pauta, principalmente porque junto com ela segue a questão dos investimentos, dos financiamentos em pesquisas e tecnologia. Um governo que nega a questão das mudanças climáticas, por exemplo, não investe em produção e consumo de energia sustentável ou em projetos de proteção e preservação de áreas ecológicas, ao contrário, incentiva a aceleração do consumo de fontes de energias que emitem CO2. A consequência é global.
Flora: Olhando um pouco mais para o passado do Brasil o professor comenta sobre a situação da ciência nos anos de ditadura militar, e que pode ser transposta ou comparada com o que temos visto no governo atual.
Marko: A ditadura fez expurgos logo no começo, né? Quando você vê em 64, 65, você já começa a expurgar, tanto o parlamento… parlamentares, juízes e pessoas críticas ao governo, ou de esquerda, ou tachar de comunista, essa lógica do anticomunismo, demonizar o pensamento contrário. Então tem expurgos e tem expurgos também na universidade, não só nas Ciências Sociais e Humanas. Em todas as áreas, inclusive física, química, engenharias. Esse expurgo está no contexto de você, digamos, expulsar da universidade, de onde se produz conhecimento, a ideia ou posturas críticas que tentam entender a ciência como alinhada ao que deseja a sociedade, a ciência como aliada de movimentos para reduzir pobreza, para produzir uma sociedade mais sustentável. Então, na ditadura você tem um fortalecimento dessa ideia, dessa postura de que a ciência é ciência só, ela não tem que ter nenhuma relação com política, ela deve produzir então os tec. As pessoas têm que ser treinadas em aspectos técnicos. Isso é muito forte ainda hoje na universidade. Essa postura tecnocrática é a que venceu. Então a ditadura, ao mesmo tempo dava muito recurso, criava universidades, criava capacidade tecnológica, mas proibia qualquer discussão crítica. Então essas coisas andam facilmente lado a lado, né? Uma ciência pensada como pura técnica, como se fosse possível separar. Mas isso é feito com violência, com perseguição, com morte, com assassinato, com tortura e consegue manter os cientistas, digamos, na linha. E ao mesmo tempo essa busca da ditadura de produzir autonomia tecnológica, em todo um projeto de longo prazo de produzir autonomia nuclear, produzir tecnologias militares, o censoriamento remoto que eu estudei, vem um pouco também dessa tentativa de ter capacidade espacial, um programa espacial próprio, tudo isso a ditadura investiu muito, mas sempre alinhado a uma postura de que não deve haver crítica social na ciência.
Fabíola: Os desafios para a retomada da ciência no Brasil são muitos. Podemos aprender com o que foi vivido no passado e refletindo sobre as diversas possibilidades de futuro. O fato que já entendemos é que a decisão e movimentos de um país afetam os demais. Nas últimas eleições dos Estados Unidos, o então presidente de extrema direita Donald Trump não foi reeleito e no Brasil as perspectivas para a ciência podem variar muito a depender de quem escolhermos para governar.
Flora: Aqui mais um trecho do artigo publicado na Revista Nature em 29 de Setembro de 2022.
Thiago: “Durante o primeiro mandato de Lula como presidente, de 2003 a 2010, seu governo investiu pesadamente em ciência e inovação, promovendo políticas sociais e ambientais que reduziram drasticamente o desmatamento na Amazônia e tiraram milhões de pessoas da pobreza. Hoje, o financiamento científico do Brasil é menor do que em cerca de 15 anos, e o país está passando por uma crise econômica que deixou 33 milhões de pessoas sem comida.”
Fabíola: Ciência, Governança, Políticas Públicas, Investimentos, Edução, Fome, Moradia, Meio Ambiente, Energia, Dignidade Humana… não são temas teóricos distantes e independentes, muito pelo contrário, são aspectos entrelaçados, que se comunicam e se relacionam. Fazem parte da nossa vida cotidiana mesmo que não tenhamos consciência disso.
Flora: Estão presentes nas ações mais corriqueiras do nosso dia a dia, como por exemplo acender a luz da nossa casa, pegar o transporte público para ir ao trabalho,ajudar uma pessoa que está pedindo o que comer no semáforo, ter acesso a um remédio de última geração para o tratamento de uma doença e muitas outras situações, até mesmo aquelas que ainda não aconteceram, como a alimentação de gerações futuras, por exemplo.
Fabíola: Pensar a ciência em toda a sua complexidade e multidisciplinaridade deve ser um compromisso de todos e principalmente daqueles que se dedicam a ela. Além disso é um compromisso de todos também, criar meios para que a ciência seja praticada em benefício de todos, humanos e não humanos. A ciência é um bem comum.
Fabíola: Este foi o segundo episódio de uma série que fala sobre Governança, Riscos e Comunicação. Assuntos pesquisados pelo grupo CIRIS, criado em 2020 com o objetivo de pesquisar e propor reflexões sobre o desenvolvimento destas áreas no Brasil. A divulgação científica dos trabalhos deste grupo é apoiada pela FAPESP através do Programa José Reis de Incentivo ao Jornalismo Científico, o Mídia Ciência.
Flora: Esse episódio foi apresentado por mim, Flora Villas e pela Fabíola Junqueira, também responsável pela pesquisa e elaboração do roteiro.
Fabíola: A leitura dos artigos foi feita pelo Thiago Ribeiro, a Amira Rald fez a edição deste episódio e a trilha sonora é do Felipe dos Reis Campos.
Fabíola: . A revisão do roteiro foi feita pela coordenadora do Oxigênio, a Simone Pallone, do Labjor/Unicamp. Os trabalhos técnicos são do Octávio Augusto Fonseca, da rádio Unicamp.
Flora: Além da indicação do podcast 151, que trata de dois dicionários sobre negacionismos e termos ambíguos erroneamente apropriados pela Direita, recomendamos o Dossiê Eleições e Democracia, da Revista ComCiência. Os links estão no site do Oxigênio.
Você também pode nos acompanhar nas redes sociais, estamos no Instagram, no Facebook e no Twitter, basta procurar por “Oxigênio Podcast”. Para acessar o roteiro deste episódio e as referências mencionadas aqui basta acessar o nosso site.
Fabíola: Deixe seus comentários em nossas redes sociais e obrigada por ouvir. Até o próximo episódio!
Referências:
Dicionário dos Negacionismos
https://www.youtube.com/watch?v=vtxsL82jqoI
Artigo Nature – “What a new president in Brazil could mean for science”, Jeff Tollefson https://www.nature.com/articles/d41586-022-03071-2?utm_term=Autofeed&utm_campaign=nature&utm_medium=Social&utm_source=Twitter#Echobox=1664493968
Artigo Tapuya – “Science is a war zone: come comments on Brazil”, Marko Monteiro
https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/25729861.2019.1708606
Site CIRIS
https://cirisgrupodepesqui.wixsite.com/ciris
RRI- Practice
https://www.rri-practice.eu/
Dossiê Eleições e Democracia
www.comciencia.br
Episódio 151 – Dicionários temáticos: significados além das palavras