Barulhentos, poluentes. Verdadeiros vilões do meio ambiente! Essas são características que resumem bem como eram os carros a diesel, não é? Por isso mesmo, desde 1976 o Brasil não permite que carros leves, os chamados carros de passeio, sejam movidos a diesel no País.
Os únicos automóveis que podem queimar o óleo derivado do petróleo são os caminhões, ônibus, picapes com capacidade de carga superior a 1.000 quilos e os veículos com características fora de estrada, os famosos quatro por quatro.
Acontece que de 1976 pra cá muita coisa mudou. Os motores a diesel evoluíram, e hoje representam cerca de 50% da frota na Europa, por exemplo. Então, será que eles são tão ruins assim? Tão poluentes?
Infelizmente o diesel ainda polui bastante. Segundo informações do Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve) e do Conselho Internacional Sobre Transporte Limpo, mesmo o óleo diesel S10, que tem adição de biodiesel e apresenta menor índice de enxofre ainda apresenta sete vezes mais emissões de óxidos de nitrogênio do que um carro a etanol. Na prática, essa substância pode aumentar o número de mortes por doenças cardiovasculares.
No entanto, o engenheiro Luso Ventura, membro da Comissão de Tecnologia Diesel da SAE BRASIL, argumenta que a tecnologia evoluiu a patamares seguros do ponto de vista de eficiência e consumo. Além disso, o que é medido, de fato, é se os motores atendem ou não às legislações e não o quão prejudicial eles podem ser.
Luso Ventura – “Agora, mundialmente o que se compara não é a poluição. Quantas gramas de poluente A, B ou C ele tem, e sim se atende aos limites definidos pelas legislações internacionais. No caso brasileiro é a PROCONVE, uma legislação que deveria ser bem dinâmica no sentido de estar sempre atualizada, mas não é o caso. No momento ela está desatualizada especialmente no caso de veículos diesel leve.”
Em linhas gerais, não quer dizer que determinado combustível seja mais seguro em termos de saúde, mas que ele se adequa ao que manda a lei. É assim para o diesel, para a gasolina e para o etanol.
Mas, ao invés de propostas para melhorar o PROCONVE visando maior rigidez no controle de emissões, tem acontecido o contrário. Está em debate uma proposta para permitir o uso do diesel por veículos leves no Brasil de autoria do então deputado e atual ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, do PV do Maranhão, e do deputado Mendonça Filho, do DEM de Pernambuco.
Pelo menos, a votação que deveria ter acontecido na semana do dia 11 de junho até o fechamento desta reportagem não tinha saído do papel e os veículos leves a diesel continuavam vetados.
A eventual liberação desses automóveis, na visão da professora Gisela de Aragão Umbuzeiro, pesquisadora da Faculdade de Tecnologia da Unicamp, é um enorme retrocesso.
Gisela Umbuzeiro – “É um combustível pesado, que irá gerar moléculas grandes, moléculas pesadas e que são carcinogênicas por definição. Então, o que estou dizendo é que a quantidade de emissão que esse carro teria que gerar seria tão mínima que eu duvido que haja tecnologia suficiente que me digam que irá melhorar a qualidade do ar. O contraponto deles é o que? Que é mais barato usar o diesel.”
É isso mesmo, professora Gisele. O diesel é mais barato do que a gasolina e do que o etanol e essa parece ser a única justificativa favorável à adoção desse combustível em carros leves.
Hoje no Brasil o carro mais econômico movido essencialmente à combustão é capaz de percorrer uma média de 15 quilômetros por litro de gasolina.
Um veículo moderno, com características semelhantes, movido a óleo diesel, rende o dobro por litro: roda até 30 quilômetros. Mas, eficiência energética e economia no bolso não parecem equilibrar a balança do outro lado, ou seja, do lado da saúde pública e do meio ambiente.
Segundo a pesquisadora Gisela Umbuzeiro, da Unicamp, o aumento de emissões é grave e tem que ser controlado. Vários estudos indicam que o maior problema da poluição atmosférica, hoje, é em virtude das emissões veiculares. E ela sugere uma solução bem radical.
Gisela Umbuzeiro – “O que precisa é parar de usar diesel e gasolina, e diminuir o trânsito e o tráfego, porque não há condições de você colocar um carro a diesel na cidade de São Paulo. Porque não há como compreender que alguém esteja fazendo uma ação para colocar diesel ao invés de uma ação para diminuir o uso da gasolina”.
Outras polêmicas acerca do uso do diesel impactam negativamente na sua adoção. Recentemente a montadora alemã Volkswagen tomou um tombo com o que ficou conhecido como o caso DIESELGATE. Uma espécie de exame antidoping identificou que cerca de 500 MIL automóveis movidos ao combustível mineral estavam fraudando os índices de emissões. Isto é, dizendo que poluíam menos do que na verdade poluíam. A Volkswagen se propôs a pagar 15 bilhões de dólares para encerrar o caso e criar um fundo para compensar o estrago causado pelos poluentes.
Caso de polícia? Talvez. O que sabemos é que foi uma situação bastante vergonhosa, concorda o engenheiro favorável ao uso do diesel, Luso Ventura da SAE Brasil.
Luso Ventura – “Eu acho que foi totalmente inesperado que uma empresa de nome, com tecnologia capaz de resolver esse problema de outro jeito tenha deixado passar esse momento. Nesse ponto foi bastante extremamente desagradável.”
As ações para diminuir o uso de automóveis, como sugere a pesquisadora Gisela Umbuzeiro, da Faculdade de Tecnologia da Unicamp, apresentam adoção mais comedida, ao passo que a pauta quanto à redução do uso de motores a combustão está na agenda de governos e empresas. Existe um grande movimento que busca popularizar e baratear os veículos híbridos e puramente elétricos, algo que aponta para um futuro teoricamente mais limpo. Sim, teoricamente: ninguém sabe ao certo os impactos dos processos de produção e descarte das baterias desses veículos. Será que estamos num beco sem saída?
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Matéria e locução de Erik Nardini.