Neste episódio a Fabíola Junqueira e a Flora Villas falam sobre o oitavo workshop realizado pelo GEICT, o Grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciência e Tecnologia da Unicamp, realizado em parceria com o grupo CIRIS, dedicado a pesquisar Governança, Risco e Comunicação a partir da crise da COVID-19.
Elas conversaram com as professoras Simone Pallone, do Labjor/ Unicamp, Gabriela Di Giulio, da Faculdade de Saúde Pública da USP, e com o professor Marko Monteiro, do Instituto de Geociências da Unicamp, líderes de pesquisa do grupo.
Este episódio faz parte de uma série que fala sobre os trabalhos do grupo CIRIS, formado por pesquisadoras e pesquisadores do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, o Labjor, e do Instituto de Geociências, ambos da Unicamp e do Programa de Saúde Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.
A divulgação científica destes trabalhos é apoiada pela FAPESP através do Programa José Reis de Incentivo ao Jornalismo Científico, o Mídia Ciência.
__________________________________________________________________
Roteiro
Fabíola Junqueira: Olá, eu sou Fabíola Junqueira e este é o primeiro episódio de uma série que fala sobre Governança, Riscos e Comunicação. Assuntos pesquisados pelo grupo CIRIS, criado em 2020 com o objetivo de pesquisar e propor reflexões sobre o desenvolvimento destas áreas no Brasil.
Flora Villas: Olá, eu sou Flora Villas Carvalho e ao longo dos episódios você vai ouvir pesquisadores e pesquisadoras que fazem parte do grupo CIRIS, dos programas de mestrado e doutorado do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, o Labjor, e do Instituto de Geociências, ambos da Unicamp e do Programa de Saúde Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, além de outros cientistas e especialistas convidados.
Fabíola: Neste episódio vamos falar sobre um aspecto essencial da ciência, o compartilhamento do conhecimento. Mais do que pesquisar, questionar e investigar, é papel da ciência compartilhar com os pares e com a sociedade as descobertas, reflexões, dúvidas, desafios e construções de pensamento que surgem ao longo do processo de compreender um fenômeno. Vamos falar também sobre o primeiro workshop realizado pelo grupo CIRIS em parceria com o GEICT, o Grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciência e Tecnologia da Unicamp.
Fabíola: No dia três de outubro de 2022 aconteceu o oitavo workshop de compartilhamento de pesquisas e reflexões do GEICT, o grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciência e Tecnologia da Unicamp. Já faz parte do calendário de atividades do grupo este tipo de encontro em que os pesquisadores compartilham seus trabalhos e debatem sobre as pesquisas. Mas este ano o evento contou com a participação de pesquisadores do grupo de estudos sobre Governança, Risco e Comunicação, o CIRIS.
Marko Monteiro: Então, Fabíola, o CIRIS é um projeto coletivo da Simone Pallone, Gabriela di Giulio e eu. Que enfim, nós temos colaborações diversas esparsas há muitos anos e com a pandemia a gente se viu colocado esse desafio de várias pesquisas ligadas a COVID. Eu e Gabriela começamos a colaborar diretamente em dois projetos, né o COMPCORE a Rede COVID de Humanidades. E aí a gente entendeu que já tava madura a nossa colaboração para a gente propor algo mais consolidado.
A gente tá tentando construir, na verdade, esse projeto de pesquisa representado por essa coisa da governança, risco e comunicação. E a ideia sempre foi produzir um laboratório permanente de de pesquisas nesses campos e por isso que nós três decidimos montar isso, né? A partir da ideia da Gabi e da Simone, 03:15
Flora: Este é o professor Marko Monteiro, professor e pesquisador do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp, ele é um dos líderes do grupo CIRIS e também orienta trabalhos de pesquisadores do GEICT. Para o próximo episódio desta série, “Obstáculos e perspectivas para as Ciências”, ele falou com a gente sobre as guerras da ciência. Vale a pena conferir.
Fabíola: Como você ouviu, a ideia do CIRIS surgiu em parceria com a Gabi e a Simone. A Gabi é a Gabriela Marques Di Giulio, professora do Departamento de Saúde Ambiental da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, a USP. Ela pesquisa sobre Ambiente e Sociedade, Ciência e Comunicação, Riscos e Incertezas, Comunicação e Governança do Risco, Percepção de Risco e Mecanismos de Participação Pública. Atualmente Gabriela é vice-coordenadora do Grupo de Pesquisa Meio Ambiente e Sociedade do Instituto de Estudos Avançados, também da USP.
Flora: A seguir ela conta pra gente o contexto em que surgiu o grupo de pesquisa e como os estudos abordam temas de quatro eixos centrais.
Gabriela: O CIRIS surge em um momento bem interessante em que os nossos olhares e reflexões estavam muito endereçados à compreensão sobre as dinâmicas da crise da covid-19, dessa crise grave sanitária do ponto de vista de saúde pública, de saúde global, mas que tem fortes entrelaçamentos também com outras crises que estão em curso, né? A gente pode pensar aí a questão da emergência climática, da crise da perda de biodiversidade, da crise da poluição, mas também crise institucional, crise de responsabilidades, crise política, econômica, crise da insegurança alimentar. Então nesse contexto e considerando as colaborações parcerias e os diálogos que já vem sendo estabelecidos há bastante tempo entre as lideranças do grupo.
Fabíola: Essa parceria de longa data, por sinal, foi destacada pelos três entrevistados. Vamos continuar ouvindo a Gabriela.
Gabriela: Então considerando essa colaboração, esse diálogo essa reflexão que a gente já havia construído, motivados por esse contexto de agravamento das crises em curso, né ancorado sobretudo nesse contexto da pandemia de covid-19 e nesse nosso desejo de consolidar a nossa colaboração científica, envolver pesquisadores estudantes em diferentes níveis, com diferentes formações, com temas que obviamente tem suas similaridades mas que permeiam olhares e perspectivas analíticas também bastante diferentes, a gente propôs então a criação do CIRIS, nessa perspectiva de ter um núcleo interdisciplinar de pesquisa, de reflexão crítica sobre as interações entre ciência, expertise, risco, comunicação, processos decisórios. Olhando alguns aspectos que a gente considera bastante críticos sobre os estudos relacionados a essas crises todas que caracterizam, de forma bastante forte esse tempo social que a gente vive.
Flora: Gabriela contou pra nós que o CIRIS se debruça sobre quatro eixos analíticos importantes. E ela explica cada um deles.
Gabriela: O primeiro sobre riscos, incertezas e crises nessa perspectiva de entender então que são esses riscos enquanto incertezas produzidas, efeitos colaterais desse projeto de modernidade, mas também riscos como uma categoria analítica importante para entender a sociedade contemporânea. Sobre como essas crises também se constituem a partir desses riscos sistêmicos, cujas relações de causa e efeito não são bem estabelecidas, caracterizadas por controvérsias, por complexidade, por ambiguidade, colocando em cheque muitas vezes o próprio conhecimento técnico-científico que é produzido e a sua capacidade de endereçar possíveis respostas, soluções, que amenizem os impactos, os efeitos dessas crises.
Gabriela: Um segundo eixo analítico bastante importante é a produção, a circulação e a usabilidade do conhecimento gerado. A gente tá muito interessado em entender como conhecimento técnico e científico que é mobilizado, produzido pela comunidade científica, pelas instituições de pesquisa, como esse conhecimento na verdade circula dentro da sociedade. E sobretudo como esse conhecimento pode ou não subsidiar decisões, seja no âmbito individual, coletivo ou institucional. Como podem ou não subsidiar políticas públicas, quais são os elementos que interferem na maior ou menor das usabilidade desse conhecimento.
Gabriela: Um terceiro eixo é mais focado na comunicação, nos enquadramentos discursivos e nos próprios fluxos de informação, sobretudo nesse momento que a gente discute muito a questão das fake news, da desinformação, dessa circulação e produção também de desinformação.
Gabriela: E um quarto eixo, que é estratégico dentro do CIRIS, que é a governança da ciência e tecnologia.
Fabíola: O workshop, que teve como tema central “Ciência e Públicos”, aconteceu no Instituto de Geociências da Unicamp, durante todo o dia, e também teve transmissão simultânea, o que permitiu a participação de pesquisadores, debatedores e ouvintes de outras regiões fora de Campinas. Além de discussões muito interessantes o clima também foi de confraternização entre amigos, afinal o CIRIS também começou a partir do vínculo da amizade.
Simone Pallone: O CIRIS é um grupo de amigos, para começar. Eu, a Gabriela, e o Marko somos amigos há muitos anos e a gente já colaborava com um e outro em disciplinas, bancas, eventos. Em 2020 o Marko teve a ideia da gente se juntar pra elaborar algo juntos, com foco em covid, já que era só nisso que a gente falava e pensava naquele momento. A ideia era pensar a covid sob o prisma dos estudos que a gente já realizava, no campo dos estudos sociais de ciência e tecnologia, pensando em ciência, risco, incerteza, comunicação, desinformação, governança. Covid era um objeto perfeito pra gente tratar essas questões de fundo, que permeiam o fazer científico, a comunicação e os impactos pra sociedade.
Uma característica que eu apontaria no CIRIS, e que talvez um pouco diferente de outros grupos de pesquisa, é que nós pensamos bastante na questão da divulgação disso tudo, né? Então, como a gente faz para o conhecimento que está sendo produzido pelo grupo chegue a uma a população, né? A grupos mais amplos, outros públicos, que não sejam do meio acadêmico
Fabíola: Esta é a professora Simone Pallone, pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp, o Labjor. A Simone atua em pesquisas sobre Percepção Pública de Ciência e Tecnologia e Jornalismo científico, extensão universitária e é a coordenadora do podcast Oxigênio. Ela é uma das líderes do CIRIS, orienta pesquisas realizadas pelo grupo no eixo da Comunicação e percepção de ciência e celebrou a participação do CIRIS no workshop.
Simone: (o GEICT) já realizada esse evento há anos, sempre convidando outros grupos e desta vez foi o CIRIS).
Flora: O caráter interdisciplinar do GEICT parece ter sido um fator importante para receber o primeiro evento de compartilhamento de conhecimento compartilhado em parceria com os pesquisadores do CIRIS.
Marko: O Geict é um grupo muito mais antigo. Começou em 2011, logo que eu entrei na Unicamp. Deriva de um projeto Jovem Pesquisador que eu consegui antes de virar professor, em 2009. Em 2010 fui contratado e continuei com esse projeto e montei o Geict como um grupo para pensar pesquisas no campo dos Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia.03:41 Que é o campo que eu trabalho. Então o projeto era voltado para antropologia da Ciência e Tecnologia que é o meu campo de origem, né o antropólogo estudava Ciência Tecnologia Continua Estudando, né? Mas desse projeto mais disciplinar eu quis construir um projeto interdisciplinar, porque assim que eu entrei no IG eu percebi que eu teria que produzir algo interdisciplinar. O DPCT é interdisciplinar, o iG é muito complexo, né? Tem geologia, geografia, então eu precisava construir um grupo que fosse mais interdisciplinar e surgiu o GEICT 04:18 congregando quase sempre meus orientandos, mas com o tempo a gente foi agregando outras pessoas, né? E a gente começou essa tradição de workshops há oito anos atrás 04:30 que era sempre uma coisa interna do grupo, discutir pesquisa em andamento, mestrados, doutorados, depois os pós docs começaram a chegar. Às vezes a gente convidava pessoas de fora, teve um ano que a gente tinha duas ou três pessoas de fora do país, por acaso tava na Unicamp e a gente sempre usou workshop como um fórum também de se apresentar para as pessoas, para as pessoas conhecerem o que a gente faz 04:55
Fabíola: A presença, comentários e contribuições dos debatedores foi essencial para a discussão. A antropóloga, mãe, pesquisadora e professora do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília, Soraya Fleischer, comentou sobre as pesquisas apresentadas.
Soraya Fleischer: Há várias razões porque esse evento é importante. A primeira delas é a retomada presencial, né de poder encontrar as pessoas de poder estar juntos na mesma sala, assistindo apresentação da pesquisa um do outro. Embora tenha sido um evento híbrido, a maior parte das pessoas estava presente no Campus da Unicamp. Eu acho que isso é uma importância do evento. Outra é a aproximação de dois laboratórios diferentes, organizados por dois professores diferentes, em dois departamentos ou unidades da Unicamp e isso é super interessante. Quando unidades conseguem perceber interesses comuns e colocar os seus estudantes e pesquisadores em formação para dialogar. Outra importância é que não fica dentro da Unicamp, mas quando eles convidam professores e professores para debater os trabalhos e esses professores e professoras são de outras universidades a Unicamp vai criando e consolidando parcerias e uma rede de trabalho.01:26
Flora: Outro debatedor foi o professor Paulo Fonseca, da Universidade Federal da Bahia, no Instituto de Ciência, Tecnologia e Inovação e pesquisador do Laboratório de Humanidades Digitais da mesma universidade.
Paulo: Bom, em primeiro lugar foi um prazer participar do 8º Workshop do GEICT, do Grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciência e Tecnologia que foi realizada em parceria com o grupo CIRIS Governança, Risco e Comunicação, com a temática de Ciências e Público. E é um evento muito importante porque é uma grande oportunidade para o compartilhamento de pesquisas em diversos estágios de andamento e principalmente para que a gente possa gerar uma aprendizagem coletiva, uma reflexão enriquecedora, debates sobre cada um dos trabalhos com propostas, com críticas, com visões que possam contribuir e qualificar ainda mais o já excelente nível dos trabalhos desenvolvidos em ambos os grupos de pesquisa. Portanto, workshops desse tipo são sempre muito frutíferos e muito proveitosos tanto por parte dos estudantes que são orientados, mas também de quem participa como comentador, como foi o meu caso, como debatedor. Mas enfim, é uma oportunidade de um aprendizado generalizado. Então é um tipo de evento que realmente deve ser sempre enaltecido e repetido, né em todas as instâncias da universidade.
Flora: A Mariana Haffiz, jornalista e mestranda do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, o Labjor da Unicamp, abriu o dia de debates. Ela falou sobre desinformação científica e de saúde. A Mariana analisou peças de desinformação sobre a vacina da COVID-19 que circularam no Brasil nos anos de 2020 e 2021. A área de estudos sobre desinformação é relativamente nova e ganhou destaque nos últimos anos principalmente por causa da crise sanitária e das campanhas eleitorais. Ela comenta que o interesse por compreender os sistemas de desinformação está presente em diversas áreas do conhecimento.
Fabíola: Os primeiros conceitos deste fenômeno foram criados por pesquisadores da psicologia, comunicação e ciências políticas. Grande parte dos trabalhos analisados por ela trata a desinformação como um problema de saúde pública e está associada ao processo de tomada de decisão dos indivíduos, como por exemplo, a hesitação no momento de tomar a vacina. Aqui a professora Gabriela comenta sobre o papel de pesquisas sobre comunicação neste momento.
Gabriela: Foi possível a gente pensar também na própria perspectiva de construção de problemas ambientais, ou socioambientais, como agregar a questão das Fake News, da desinformação, dessa circulação de produção e circulação de desinformações nesse contexto de produção ou construção social de um problema. Particularmente a gente discutiu bastante na própria construção social da crise da covid-19. Foi possível também a gente olhar como alguns instrumentos, alguns produtos mais focados também na circulação de informação, podem ser analisados à luz de uma perspectiva analítica que olhe a própria mobilização de organizações da sociedade civil para discutir questões socioambientais, mas também pensar perspectivas analíticas que não são muito claras quando a gente se debruça sobre os próprios estudos da comunicação ou de STS como a questão de pluralidade de ideias, como a questão de independência na produção e circulação dessas informações.
Fabíola: Depois da Mariana ouvimos o Felipe dos Reis Campos, doutorando do programa de Saúde Global da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Felipe investigou como a comunicação pode fazer parte de um sistema de desinformação intencional, principalmente considerando o conceito de Imunidade de Rebanho e das Negações de aspectos importantes vividos pelo Brasil na crise deflagrada pela covid-19. A partir da perspectiva construcionista, que revela que a percepção de risco de dano é mais importante na formação da opinião pública do que as probabilidades objetivas, o pesquisador analisou o conteúdo de mais de mil tuítes publicados por integrantes do gabinete paralelo, um grupo formado por políticos de direita, empresários e médicos próximos aos membros do governo federal, nos anos de 2020 e 2021.
Flora: Algumas das desinformações transmitidas por este grupo foram “lockdown mata”, “cloroquina vence o coronavírus”, “vacinas são lixo” e “o partido chinês restringe a liberdade ocidental”. Além disso, o pesquisador abre a reflexão sobre o papel das tecnologias e algoritmos que sugerem conteúdos relacionados às preferências do leitor, sem preocupação crítica sobre a qualidade da informação.
Fabíola: Seguindo na linha de investigação de mídia, ajustamos a bússola e seguimos em direção ao estado do Amazonas. O pesquisador Juan Matheus Gil Costa investigou o papel socioambiental do boletim “Observatório BR-319”. A BR-319, também conhecida por Manaus/Porto Velho ou Álvaro Maio, inaugurada em 1976, durante a ditadura civil militar, é a única rodovia que liga a capital do Amazonas ao restante do Brasil por via terrestre.
Flora: Por falta de manutenção e cuidados a rodovia ficou intransitável em pouco mais de 10 anos, sendo interditada em 1988. Desde os anos 1990 planos e soluções vêm sendo apresentadas por diversos governos, porém esbarrando em controvérsias técnicas, científicas, sociais e ambientais. Em 2022 o IBAMA emitiu uma licença prévia para a reconstrução de um dos trechos da rodovia. O pesquisador se dedicou a investigar os boletins produzidos pelo site de notícias “Observatório da BR-319”.
Fabíola: As apresentações do período da manhã foram finalizadas com reflexões sobre a virtualização do lazer e as interações entre influenciador e consumidor digital. O pesquisador Pedro Vinícius da Silva, observou mudanças ocorridas na sociedade contemporânea devido ao desenvolvimento digital e das tecnologias da informação na área do lazer e entretenimento, analisando o papel e o trabalho de influenciadores digitais como uma nova categoria profissional ora no universo dos jogos, ora nas mídias sociais. Vinícius se baseia na teoria da cultura de convergência para buscar compreender o novo consumidor digital e como as velhas e novas mídias se relacionam.
Paulo: Ficou muito clara a grande relevância de todos os temas discutidos tanto nas na sessão da manhã quanto na sessão da tarde. Claro que existia um eixo em comum, que é principalmente os estudos interdisciplinares sobre Ciência e Tecnologia, mas como a gente sabe, esse é um campo bastante abrangente e flexível. E o que a gente pôde perceber foi que houve uma amostra muito significativa de como que esse campo do conhecimento pode contribuir não só para compreensão de problemas cruciais da sociedade contemporânea, especialmente no que toca às relações entre ciências, tecnologias e sociedade, mas também para a produção de soluções e de entendimentos que possam contribuir diretamente, por exemplo para políticas públicas, para políticas acadêmicas, enfim para dinâmica de produção de conhecimento.
Fabíola: A mesa do período da tarde foi composta por cinco pesquisadores que falaram sobre “Ciência e saúde: saberes, públicos e atores”. Douglas de Albuquerque Leite fez uma reflexão sobre a ontologia política nos estudos de Ciência, tecnologia e sociedade. Ele se dedicou a compreender a ontologia política como instrumento analítico para o campo de estudos de Ciência e Tecnologia. Uma das perspectivas é que o ser se relaciona com o entorno em um processo de conscientização de sua existência, em constante conformação, em diversos contextos, mobilizando elementos humanos e não-humanos. Um elemento importante para esta compreensão é a historicidade, também abordada pelo pesquisador.
Flora: Em seguida, a pesquisadora Roberta Custódio Cavedini trouxe informações importantes sobre o papel da produção de conhecimento científico na legalização da maconha medicinal. Ela investigou as relações entre a produção de conhecimento científico e o processo de legalização e regularização da maconha medicinal. Ela analisou artigos e publicações sobre o tema na perspectiva dos estudos sociais da ciência, identificou controvérsias e relacionou com o processo político regulatório considerando a primeira versão do Projeto de Lei 399 de 2015, que propõe viabilizar a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta Cannabis sativa em sua formulação.
Fabíola: Aqui a professora Soraya novamente.
Soraya: A minha perspectiva é da antropologia da Saúde. Então os temas que que dialogam com a saúde, com adoecimento, com qualquer tipo de transtorno e sofrimento me interessam em particular. Eu queria destacar então, por exemplo, o trabalho da da Roberta Cavedine que tá pensando a Cannabis Sativa não apenas como uma planta, mas como uma molécula. Então quando ela vai passando de de uma planta para diferentes moléculas, como por exemplo, o THC ou Canabidiol, o CBD, ela vai ganhando roupagens morais, políticas, técnicas, diferentes, e a ciência ela entra como um dos atores que vai sanitizando essa planta de toda a sua história e vai transformando essa planta numa molécula. Por exemplo o CBD muito mais purificado, muito menos dilemático e controverso. Então é muito interessante o papel da ciência como mais um dos atores nesse debate, né?
Fabíola: O pesquisador Lucas Nishida analisou como a participação pública contribuiu com o processo de ampliação da incorporação do medicamento mais caro incluído ao Sistema Único de Saúde, o SUS, em 2019. Estamos falando do Nusinersena. Um medicamento que já estava sendo usado para o tratamento de Atrofia Muscular Esquelética ou AME de Tipo I, uma doença neuromuscular rara. Em 2021, houve o pedido de ampliação do uso do medicamento para os tipos II e III da doença. Houve aprovação apenas para o tipo II.
Flora: Há desafios na construção de conhecimento por evidências desta área. Justamente por se tratar de uma doença rara, há poucos indivíduos portadores da AME participantes de pesquisas e deve-se considerar então dados da vida cotidiana dos pacientes, prática não usual nas pesquisas farmacológicas baseadas em evidências que geralmente utilizam grandes números de amostra e grupos controle.
Fabíola: Foi pensando em compreender a percepção sobre a pandemia de covid-19 por um grupo específico de pessoas que a pesquisadora Karina Francisco está se dedicando a ouvir os mais velhos. A pesquisadora está conversando com pessoas acima de 60 anos, aquelas consideradas inicialmente como pertencentes ao grupo de risco da pandemia. O objetivo é investigar como essas pessoas recebem, analisam e passam as informações à frente quando o assunto é covid-19. Isso tudo a partir de hábitos e comportamentos, compreensão de riscos e incertezas, relação com notícias e cuidados.
Soraya: Elas foram mostrando que uma doença é percebida de muitas maneiras, sobretudo um grupo que tem aí uma circunferência geracional, um recorte geracional e tido como grupo de risco inclusive, por muitos epidemiologistas, e ainda assim eles foram percebendo o covid como mais ou menos perigoso, que precisava ser prevenido dessa ou dessa maneira, que provocava tais e tais danos. Então assim três grupos diferentes de idosos com percepções diferentes sobre covid e que repercutia nas suas práticas cotidianas de relacionamento e autocuidado super interessante também, né? A pandemia do covid não é uma única e homogênea pandemia.
Flora: Por fim, as apresentações foram encerradas com a apresentação da pesquisadora Marisol Monteiro, que falou sobre antropologia pública e usos da etnografia. Marisol se dedicou a investigar sobre antropologia pública, partindo dos debates sobre a atuação e contribuições da área na tarefa de democratização do conhecimento e da possibilidade de engajamento da antropologia na governança da tecnociência.
Fabíola: O processo partiu do questionamento da autonomia e do papel dos cientistas na tomada de decisões políticas e na mitigação de riscos diante de inovações. O mapeamento de controvérsias acerca de questões que envolvem os povos originários, por exemplo, pode ser uma das contribuições da área para a governança de ciência e tecnologia. Ou o uso dos conhecimentos da área para refletir sobre potenciais riscos oriundos da inovação científica e tecnológica.
Simone: Essas apresentações, esses eventos de forma geral ajudam também a identificar pontos de contato entre os estudantes, né? E que podem se transformar em artigos ou palestras, ou pesquisas conjuntas no futuro, então isso também é muito importante e um resultado esperado também do evento.
Flora: Novamente, Simone destaca a questão da divulgação dos trabalhos para o público não acadêmico
Simone: Ou seja, trabalhos bem relevantes, e que podem ter uma boa repercussão no meio acadêmico, quando eles publicarem artigos ou a própria dissertação ou tese, que vão ser publicadas. E podem ser importantes pro público em geral, quando os trabalhos tiverem alguma divulgação porque são temas bem palpáveis, que despertam o interesse de pessoas de fora da academia, né? Principalmente temas relacionados à saúde, a questão também de games, né? Que também com certeza vai atrair um público que não é o público acadêmico, né?
Fabíola: Pensar a ciência em toda a sua complexidade e multidisciplinaridade deve ser um compromisso de todos e principalmente daqueles que se dedicam a ela. Além disso, é um compromisso da sociedade também, criar meios para que a ciência seja praticada em benefício de humanos e não humanos. A ciência é um bem comum.
Fabíola: Este foi o primeiro episódio de uma série que fala sobre Governança, Riscos e Comunicação. Assuntos pesquisados pelo grupo CIRIS, criado em 2020 com o objetivo de pesquisar e propor reflexões sobre o desenvolvimento destas áreas no Brasil. A divulgação científica dos trabalhos deste grupo é apoiada pela FAPESP através do Programa José Reis de Incentivo ao Jornalismo Científico, o Mídia Ciência.
Flora: Esse episódio foi apresentado por mim, Flora Villas e pela Fabíola Junqueira, também responsável pela pesquisa e elaboração do roteiro. A trilha sonora foi feita pelo Felipe Reis.
Fabíola: A revisão do roteiro foi feita pela coordenadora do Oxigênio, a Simone Pallone, do Labjor/Unicamp. Os trabalhos técnicos são do Octávio Augusto Fonseca, da rádio Unicamp.
Flora: Você também pode nos acompanhar nas redes sociais, estamos no Instagram, no Facebook e no Twitter, basta procurar por “Oxigênio Podcast”. Para acessar o roteiro deste episódio e as referências mencionadas aqui basta acessar o nosso site.
Fabíola: Deixe seus comentários em nossas redes sociais e obrigada por ouvir. Até o próximo episódio!
Referências:
Site CIRIS: https://cirisgrupodepesqui.wixsite.com/ciris