#115 – Leitura de fôlego ep 02: O ensaio em cena ou o espetáculo da dúvida
dez 23, 2020

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Às vésperas do Natal de 2020, ano difícil, de pandemia de Covid-19 e isolamento social, o Oxigênio traz o segundo episódio da série “Leitura de Fôlego”, uma forma de nos conectarmos com nossos ouvintes com um tema mais suave para esses dias em que começamos a desacelerar. “Leitura de Fôlego” é uma série que apresenta temas de pesquisas de professores do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), da Unicamp. Nesse episódio, conversamos com o professor e pesquisador Alexandre Soares Carneiro sobre um tipo de texto que pode assumir diferentes formatos e que dá liberdade para seus escritores revelarem o processo irregular de seus pensamentos, suas dúvidas e até seus defeitos, tudo isso em um tom parecido com uma conversa. O assunto de hoje são os ensaios. Após ouvir algumas características desse texto, vamos conhecer mais sobre um importante ensaísta francês do século XVI, Michel de Montaigne. Ele inaugurou o uso da palavra “ensaio” para se referir a esse tipo de texto e escreveu sobre os mais diversos temas: desde o pedantismo, os índios canibais até os polegares. Depois, nossa conversa passou pelo ensaísmo brasileiro, que é mais importante do que parece. E acabou com dicas para quem quiser começar ou continuar a ler esse tipo de texto.

Quem está à frente deste projeto é a Laís Souza Toledo Pereira, com supervisão e edição de Simone Pallone e trabalhos técnicos de Gustavo Campos e de Octávio Augusto Fonseca. Quem ajuda na divulgação do podcast é a Helena Ansani Nogueira. Vamos ao episódio, que é o número 115 do Oxigênio.

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Laís Toledo: Oi! Eu sou a Laís Toledo, e esse é um episódio da “Leitura de fôlego”, uma série sobre Literatura pro podcast Oxigênio. 

Laís: Os bastidores dos nossos pensamentos não são nada glamurosos. Hesitações, dúvidas, correções… A gente tende a não querer mostrar esse tipo de coisa. Ainda mais em um contexto entulhado de textão nas redes sociais, com mitos de um lado e cancelados do outro… Outra coisa que a gente não gosta muito de mostrar são as nossas frustrações, as nossas imperfeições. É filtro, edição, marketing pessoal e #gratidão que não acaba mais… A conversa de hoje é sobre um tipo de texto que autoriza o autor a se mostrar, sem certezas e sem enfeites. Vamos falar sobre Ensaios. Quem conversa com a gente hoje é o Alexandre Soares Carneiro, professor do Instituto de Estudos da Linguagem, o IEL, da Unicamp. Sua trajetória de pesquisa abrange assuntos como Literatura Portuguesa, Literatura Medieval e o Renascimento. E, há mais de dez anos, ele tem se dedicado a pesquisar também o nascimento e as transformações do gênero ensaístico.

Bom, o ensaio é um tipo de texto que dá espaço pro autor se mostrar, com suas dúvidas e imperfeições. Mas ele é muito mais do que isso. Pra começar essa conversa, eu pedi pro Alexandre dizer como ele definiria um ensaio.

Alexandre Soares Carneiro: Eu diria que o ensaio é um texto de reflexão de forma livre, o que dificulta muito uma definição, porque obviamente ele pode assumir aspectos muito variados. Mas podemos identificar a tal liberdade do ensaio no fato de o ensaísta expressar não apenas o resultado final, mas um pouco do processo irregular do pensamento, desde a formulação de um problema, uma dúvida, um paradoxo que ele observou, passando pelas hipóteses iniciais, as hesitações, desvios, correções. O ensaio tende a incorporar as dúvidas naturais do processo de reflexão, talvez como as perguntas de um interlocutor imaginário, o que remete à característica dialógica do pensamento. Assim, a gente pode associar o ensaio à conversação, com sua típica a-sistematicidade. A liberdade de testar ideias ou perspectivas insólitas também pode ser associada ao espírito da conversação.

Laís: Além dessa associação com a conversa, com sua natureza não sistemática, não organizada, o Alexandre falou também sobre uma diferença entre a palavra “ensaio” e os textos com características de ensaio. 

Alexandre: O Francis Bacon dizia, no início do século XVII, que a palavra “ensaio” era nova, mas a coisa antiga. Ele dá como exemplo as cartas filosóficas de Sêneca. Essa aproximação do ensaio com as cartas é esclarecedora, pois elas são claramente um gênero dialógico. Poderíamos recuar aos diálogos de Platão, assentados nas perguntas de Sócrates. Montaigne frequentou muito esses autores e seus imitadores renascentistas. O ensaio poderia ser entendido, então, como uma expressão moderna dessa reflexão experimental e dialógica. Enfim, frequentemente vamos encontrar no ensaio pessoalidade, liberdade e um esforço de descrever ou redescrever um problema, de modo necessariamente não sistemático.

Laís: Se definir um “ensaio” não é uma tarefa simples, e, se a origem desses textos é imprecisa, o uso da palavra “ensaio” para falar desse gênero é mais localizado. E ele tem a ver com alguém que o Alexandre acabou de mencionar, o francês Michel de Montaigne, que escreveu um livro chamado justamente Ensaios.

Alexandre: Os Ensaios de Montaigne são naturalmente a grande referência para o gênero. Montaigne usou como título uma palavra que servia para mostrar a singularidade e a modéstia do seu empreendimento. Mas ele acabou oferecendo ao leitor um tipo de escrita muito atraente em sua liberdade, pois, no final, como disse o crítico André Tournon, “sua modéstia o libera”. Ele definiu um gênero que abria novos caminhos para a reflexão, criando também um novo público, de leigos cultos, que liam e escreviam em vernáculo, e não mais em latim. Foi um livro muito lido e “imitado”, desde sua publicação.

Laís: Os Ensaios têm 3 volumes, ou 3 livros, que foram escritos e reescritos pelo Montaigne de 1571 até 1592, quando ele morreu. Ah, ler e escrever em vernáculo é fazer essas atividades na língua do seu país. No caso do Montaigne, em francês, não em latim, por exemplo, como era costume entre os mais cultos daquela época. O Alexandre falou mais sobre algumas características desses textos do Montaigne:

Alexandre: Ele queria registrar suas reflexões, que eram bastante breves na origem, a partir da leitura de autores antigos e modernos, mas também de eventos que presenciou. Aos poucos, em sucessivas reescrituras, ele foi dando um viés mais livre e pessoal aos textos, ampliando-os muito. Foi se sentindo mais à vontade para julgar autores, eventos e questões, e parece que se inspira no próprio movimento da escrita para encadear novas digressões, e discutir a própria escrita, o próprio livro, e a si mesmo. Isso é muito estimulante para os leitores, pois ele tem um repertório de assuntos muito variado, e hipóteses para sugerir, na forma de comentários livres.

William Hazlitt, o grande ensaísta inglês do século XIX, dizia que o mérito de Montaigne foi ter sido “o primeiro que teve a coragem de dizer como autor o que sentia como homem”. Ele se expõe muito, mas de um jeito frequentemente irônico, e até um pouco perverso. Como disse um contemporâneo seu, “agradava-lhe desagradar agradavelmente”. A gente se deixa impregnar pelo livro e pelo jeito característico que o autor tem de abordar as coisas.

Laís: Vamos ouvir a nota “Ao leitor”, que o Montaigne escreveu como abertura de seus Ensaios. Acho que, com esse trecho, dá pra perceber alguns aspectos que o Alexandre destacou. A edição que eu tenho aqui é a publicada pela Editora 34, com tradução do escritor Sérgio Milliet.

Samuel Ribeiro: 

Eis aqui, leitor, um livro de boa-fé.

Adverte-o ele de início que só o escrevi para mim mesmo, e alguns íntimos, sem me preocupar com o interesse que poderia ter para ti, nem pensar na posteridade. Tão ambiciosos objetivos estão acima de minhas forças. Voltei-o em particular a meus parentes e amigos, e isso a fim de que, quando eu não for mais deste mundo (o que em breve acontecerá), possam nele encontrar alguns traços de meu caráter e de minhas ideias e assim conservem mais inteiro e vivo o conhecimento que de mim tiveram. Se houvesse almejado os favores do mundo, ter-me-ia enfeitado e me apresentaria sob uma forma mais cuidada, de modo a produzir melhor efeito. Prefiro, porém, que me vejam na minha simplicidade natural, sem artifício de nenhuma espécie, porquanto é a mim mesmo que pinto. Vivos se exibirão meus defeitos e todos me verão na minha ingenuidade física e moral, pelo menos enquanto o permitir a conveniência. Se tivesse nascido entre essa gente de quem se diz viver ainda na doce liberdade das primitivas leis da natureza, assegure-te que de bom grado me pintaria por inteiro e nu.

Laís: Claro que essa advertência inicial tem um quê de dissimulação, para conquistar a generosidade dos leitores, já que o Montaigne não deixou os ensaios só para os seus íntimos, mas ele publicou seus textos. De qualquer forma, as motivações que ele apresenta pro seu livro aproximam os textos a uma conversa entre amigos, uma aproximação que o Alexandre já tinha feito na definição que ele deu para o gênero ensaio. No caso do Montaigne, essa aproximação entre ensaio e conversa pode até ser relacionada a um acontecimento da vida dele.

O Montaigne foi muito amigo do Étienne de La Boétie, que ficou conhecido por ter escrito, ainda na adolescência, o Discurso da servidão voluntária. Só que, com 33 anos, o La Boétie ficou doente e morreu. Isso abalou muito o Montaigne. E tem um crítico literário suíço, Jean Starobinski, que fala que, na falta de La Boétie, os Ensaios seriam uma tentativa do Montaigne de estender esse diálogo que ele tinha com o amigo.

Bom, mas agora vamos ver os ensaios um pouco mais de perto. Para dar uma ideia de como era vasto o repertório de assuntos comentados pelo Montaigne, outra coisa que o Alexandre já falou, eu vou citar só alguns títulos de capítulos dos Ensaios

Somente depois da morte podemos julgar se fomos felizes ou infelizes; De como filosofar é aprender a morrer; Da loucura de opinar acerca do verdadeiro e do falso unicamente de acordo com a razão; Da amizade; Dos canibais; Como uma mesma coisa nos faz rir e chorar; Da solidão; Dos odores; Da incoerência de nossas ações; Da embriaguez; Dos polegares; A covardia é a mãe da crueldade; Dos correios; Da inconveniência de se fingir de doente…

Acho que deu pra ter uma ideia da diversidade de temas tratados pelo Montaigne. Inclusive, lá na França, no verão de 2012, o crítico literário Antoine Compagnon apresentou um programa de rádio em que ele escolheu alguns desses vários temas dos Ensaios para fazer comentários, de menos de 5 minutos por dia. O Compagnon disse que, quando as pessoas estivessem tomando sol na praia ou se preparando pra almoçar, elas iam ouvir falar de Montaigne no rádio. Para ele, essa ideia era tão bizarra e o desafio tão arriscado, que ele não ousou recusar o convite. Depois, os roteiros desses programas de rádio foram reunidos em um livro, publicado no Brasil pela editora Martins Fontes, chamado Uma temporada com Montaigne. Bom, mas pra gente ter um exemplo mais concreto desses textos do Montaigne, eu pedi pro Alexandre escolher e apresentar um dos ensaios pra gente.

Alexandre: Gosto muito de um texto chamado “Do pedantismo”, que é o capítulo 25 do livro I. A palavra “pedante” ali quer dizer “professor”, e Montaigne se pergunta por que o professor se tornou, no teatro cômico de sua época, um tipo caracterizado pela extrema tolice. Embora seja um erudito, ele será vítima das trapaças de gente sem estudo e do riso da plateia. E, mesmo quando sua tolice fica evidente a todos, mantém sua arrogância, que se manifesta na linguagem empolada, dentro do conceito atual de pedante. Montaigne se indaga sobre esse paradoxo (mais estudo levando a mais tolice), valorizando a intuição cômica do teatro como algo revelador. Ele parte do olhar cômico e toma o riso como uma evidência incontornável. Ele irá, então, testar várias respostas, até chegar à conclusão de que a educação pode ajudar, mas também prejudicar o julgamento. Tudo depende do modo como cada um se relaciona com o conhecimento, o que parece uma boa definição de sabedoria. Na sequência, ele propõe uma fórmula ainda mais eloquente – que não devemos nos perguntar o quanto uma pessoa sabe, mas como ela sabe. Esse deslocamento da quantidade para o modo é uma solução muito elegante para um problema que ele havia elaborado exaustivamente.

Laís: Vamos ouvir um trechinho desse ensaio, que mostra bem o que foi destacado até agora pelo Alexandre. Diz o Montaigne:

Samuel Ribeiro: [Alguns] Sabem dizer “como observa Cícero”, “eis o que fazia Platão”, “são palavras de Aristóteles”, mas que dizemos nós próprios? Que pensamos? Que fazemos? Um papagaio poderia substituir-nos. […] E conheço um [sujeito] que ao ser indagado acerca do que lhe cumpre saber, vai logo buscar um livro para mostrar e jamais ousaria dizer que tem o traseiro sarnento sem previamente procurar em dicionário a significação de sarna e de traseiro. 

Laís: Bom, mas o ensaio “Do pedantismo” não para por aí. Depois de fazer esse deslocamento de importância do quanto uma pessoa sabe para como essa pessoa sabe, o Montaigne começa outro movimento…

Alexandre: A partir daí ele começa a exagerar um pouco, fazendo uma espécie de “elogio da ignorância”, mostrando como, ao longo da história, pessoas e povos se arruinaram pelo excesso de estudo. Isso lembra muito o Elogio da Loucura de Erasmo, e outros elogios paradoxais renascentistas. Ele obtém efeitos muito interessantes com esse tom que a gente chama de joco-sério, recuperando a perspectiva cômica que havia sido ponto de partida para uma discussão séria. É uma reflexão breve, densa, provocativa, meditada, mas sem qualquer pompa. Esse capítulo estaria na origem de um texto mais amplo, e mais famoso, que vem na sequência, chamado “Da educação das crianças”. Ele começa esse texto contando que discutira aquelas breves ideias, sobre o pedantismo, com algumas pessoas, e, a partir dali, fora instado a formular um guia para a educação do jovem nobre. Ele adota então um tom mais sentencioso, mas remetendo ao espírito de discussão e de sátira do capítulo anterior.

Laís: O Alexandre também estuda os elogios paradoxais, que, sozinhos, renderiam outro episódio aqui pra série “Leitura de Fôlego”. Mas, só para comentar rapidinho, os elogios são outro tipo de texto, feitos para exaltar alguém ou alguma coisa. E os elogios paradoxais são aqueles que elogiam pessoas ou coisas que, a princípio, parecem não merecer um elogio. Existe, por exemplo, o Elogio da Mosca, o Elogio da Mão e o Elogio da Loucura, que foi o que o Alexandre mencionou. Nesse elogio, do Erasmo de Rotterdam, é a própria Loucura que ganha voz e se elogia. 

Laís: Bom, a gente já ouviu um pouco do que é o gênero literário ensaio e conhecemos um pouco dos Ensaios do Montaigne. E no Brasil? A gente já teve, ou tem, ensaístas?

Alexandre: O ensaísmo no Brasil é mais importante do que parece, talvez porque a palavra não tenha sido tão usada. Temos, assim, alguns notáveis ensaístas “ignorados”. Drummond é famoso como cronista e poeta, mas mostra-se muito à vontade no gênero, por exemplo, no livro chamado Passeios na Ilha. Ficcionistas importantes escreveram ensaios, embora ninguém tenha se preocupado muito em chamá-los por esse nome. Penso em Guimarães Rosa e Nelson Rodrigues. Quanto ao último, o professor Fischer, do Rio Grande do Sul, defendeu, em um livro, a ideia de um Nelson ensaísta.

Laís: Pra quem ficou curioso, esse livro se chama Inteligência com dor: Nelson Rodrigues ensaísta e foi publicado pela Arquipélago Editorial. Bom, mas além desses escritores que muitas vezes não são chamados de ensaístas, o Alexandre falou também de alguns críticos literários brasileiros que escreveram ensaios relevantes.

Alexandre: Outros ensaístas que aprecio são Augusto Meyer e Alexandre Eulalio. São autores que a gente lê, aprende e ainda fica admirado com o estilo, e estimulado a ler os textos comentados.

Laís: Nosso entrevistado também comentou que o Alexandre Eulalio escreveu sobre a história do ensaio no Brasil, recuperando o interesse por autores que estavam totalmente esquecidos.

Alexandre: Ele tem também um belo texto sobre Minha Vida de Menina, de Helena Morley, chamando de “livro que nasceu clássico” ao diário de uma adolescente interiorana. 

Laís: O famoso crítico literário e sociólogo Antonio Candido também entra nesse grupo de importantes ensaístas brasileiros.

Alexandre: O gênero teria um certo viés antiacadêmico, anunciado pelos capítulos de Montaigne que comentei, mas a gente sempre pensa em contra exemplos como o do professor Antonio Candido, um escritor muito culto, perspicaz e elegante. Cito um ensaio dele sobre a crônica, chamado “A vida ao rés do chão”. Foi o primeiro texto de crítica literária que li. Descobri então que um comentário sobre literatura também pode ser lido como literatura, elucidando com inteligência e nos envolvendo com uma visão pessoal. Lembro de passagem que a crônica é um gênero aparentado ao ensaio, podendo ser associado ao que os ingleses chamam de “ensaio familiar”.

Laís: Existem estudiosos que dividem os ensaios em dois tipos: o ensaio formal, de um lado, e o familiar, ou informal, de outro. Esse primeiro tipo seria mais metódico e incluiria, por exemplo, os ensaios críticos, filosóficos, políticos e científicos. Já os ensaios familiares seriam mais informais, pessoais. É mais desse segundo tipo de ensaio que a gente estava falando até agora, e é ele que é parecido com as crônicas brasileiras. Bom, mas o Alexandre comentou um pouco mais sobre a relação entre o ensaísmo e a crítica literária: 

Alexandre: Além disso, tal como no caso dos textos de Alexandre Eulalio que citei, trata-se de valorizar autores, textos e gêneros considerados de menor importância. Isso faz pensar naquelas ideias de liberdade e ousadia do ensaio, mas também nos leva ao tema da qualidade literária do ensaísta, motivado pelo esforço de descrever objetos a partir de um apreço pessoal por eles. Essa pessoalidade e esse amor parecem inspirar o autor, e a nós leitores, quando o escritor é bom. Para mim, uma aspiração muito digna para a crítica. Recomendo, ainda, os ensaios do professor Paulo Rónai; por exemplo, os seus livros Encontros com o Brasil e Como aprendi o português e outras aventuras.

Laís: A gente está chegando ao fim do episódio, mas, antes de acabar, eu pedi pro Alexandre recomendar alguns ensaios ou ensaístas, pra quem ficou animado para ler algo nesse estilo depois dessa conversa. Ah, eu vou deixar, no fim da descrição do episódio, uma lista com os nomes de todos os autores citados pelo Alexandre. 

Alexandre: Vou mencionar alguns dos meus ensaístas prediletos. O primeiro é Jorge Luis Borges, que deu ao ensaio latino-americano uma característica de universalidade, com muita variedade de temas, alguns insólitos. “Profundidade e erudição não costumam andar juntas, e a isso Borges ainda acrescentou a graça e a sedução” – é o que comenta Cioran, outro ensaísta que admiro muito, em um perfil presente no seu livro Exercícios de Admiração. Um autor incontornável do ensaísmo do século XX é George Orwell, pela qualidade de sua reflexão, seu estilo direto e a coragem de enfrentar temas difíceis, como a submissão de intelectuais ocidentais a ideologias autoritárias, tema que conhecemos melhor através de sua ficção.

Laís: Muita gente já conhece o Orwell como autor de A Revolução dos Bichos e de 1984, mas eu vou aproveitar a deixa do Alexandre para mencionar dois livros de ensaios desse escritor, com traduções brasileiras publicadas pela Companhia das Letras: O que é Fascismo? E outros ensaios e Como morrem os pobres. E outros ensaios. Voltando às dicas do Alexandre, ele mencionou mais alguns escritores. O Stevenson, que ele vai comentar agora, é mais conhecido por ser o autor de O médico e o monstro

Alexandre: Outro autor mais conhecido como ficcionista, Robert Louis Stevenson, tem ensaios de grande qualidade estilística. Autores de língua inglesa sempre nos vêm à mente quando se fala na história do ensaio. Pessoalmente, tenho grande admiração por esse escritor do século XIX que citei, William Hazlitt. A revista Serrote traduziu um texto dele a respeito do ensaio. Aliás, muitos ensaístas escreveram sobre o ensaio. Entre os italianos modernos, citarei Pasolini e seus “Escritos corsários”, com um viés mais polêmico, há pouco traduzidos no Brasil por Maria Betânia Amoroso; cito também o crítico literário Alfredo Berardinelli. Entre autores de língua alemã, valorizo muito os textos de Auerbach, entre eles seu ensaio de juventude sobre Montaigne. O ensaísmo hispânico tem muitos autores importantes, mas destaco um espanhol pouco conhecido no Brasil, Azorín… Ramón Gomez de la Serna escreveu sobre o circo, as ruas de Madri, e seu famoso mercado de pulgas (el Rastro), entre outros temas ditos “costumbristas”. 

Laís: “Costumbrista” tem a ver com costumes típicos de uma região, com temas cotidianos, habituais. 

Aalexandre: Há ainda os novecentistas Mesonero Romanos e Mariano José de Larra. Em língua francesa, citaria, além de Cioran, o grande erudito, há pouco falecido, Marc Fumaroli, e o suíço Jean Starobinski, porque são autores de importantes estudos sobre Montaigne. Há ainda romancistas e poetas que escreveram ensaios importantes, me ocorre falar agora de Michel Houellebecq, que é um romancista famoso, atual, contemporâneo, que tem ensaios interessantes, entre eles, um sobre Lovecraft.

Laís: Depois dessas dicas, com ensaístas de diferentes países e épocas, o episódio de hoje fica por aqui. Espero que você se sinta instigado a ler e até a escrever esse tipo de texto. Se você tiver alguma dica de ensaísta ou de ensaio, fala pra gente. Estamos no Facebook (facebook.com/oxigenionoticias – tudo junto e sem acento). E no Instagram e no Twitter também, basta procurar por “Oxigênio Podcast”.

Laís: O roteiro e a narração desse episódio foram feitos por mim, Laís Toledo. Os trabalhos técnicos foram feitos pelo Gustavo Campos e pelo Octávio Augusto, da rádio Unicamp. A revisão do roteiro e a coordenação do Oxigênio são de Simone Pallone. A leitura do trecho do livro Ensaios foi feita pelo Samuel Ribeiro. 

 

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Lista de ensaístas indicados no episódio:

  1. Jorge Luis Borges
  2. Emil Cioran
  3. George Orwell (peseudônimo de Eric Arthur Blair)
  4. Robert Louis Stevenson
  5. William Hazlitt
  6. Pier Paolo Pasolini
  7. Alfredo Berardinelli
  8. Erich Auerbach
  9. Azorín (pseudônimo de José Augusto Trinidad Martínez Ruiz)
  10. Ramón Gomez de la Serna
  11. Mesonero Romanos 
  12. Mariano José de Larra 
  13. Marc Fumaroli
  14. Jean Starobinski
  15. Michel Houellebecq

Créditos das trilhas:

“Dash and slope”, Castro.
“Um Pepino”, Orange Cat.
“Curiously and Curiously”, Calumet.
“Stately Shadows”, Duck Lake.
“In Passage”, Migration.
“Vernouillet”, The Sweet Hots.
“Borough”, Molerider.

Todas do Blue Dot Studios (https://www.sessions.blue/)

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